08/08/2019, 12:57
Dureza pura
por André Cunha
Mulheres Difíceis, escrito por Roxane Gay e publicado no Brasil pela Globo Livros, é uma coletânea de contos que retratam mulheres de personalidade… difícil. Apesar disso, a leitura da maioria das histórias flui com facilidade. A contracapa vem lotada de elogios. Pra revista People, Gay é “provocativa, chocante, hilária.” Pro The Guardian, “uma autora prodígio, um talento surpreendente.” A orelha descreve os contos como “magistrais” e “um panorama impressionante e ousado do que é ser mulher hoje em dia.”
Convenhamos, todas as mulheres são difíceis, todos os homens também, afinal a própria condição humana implica em certa… dificuldade. O que a autora faz é explorar a sensibilidade feminina nos Estados Unidos hoje em dia, uma sociedade consumista, violenta, desigual e muitas vezes intolerante com a diferença. Os personagens masculinos são em grande parte machistas, agressivos e, no limite, criaturas repulsivas. As pessoas em geral são falsas. As histórias tendem a acabar mal.
Uma personagem é descrita dessa forma: “Milly é gorda e feia, mas faz um bom boquete, então quase nunca dorme sozinha, o que não significa que não se sinta sozinha. Na realidade Milly não é feia, mas bem que podia ser. Tem o rosto bonito, o que equivale a ser feia quando a mulher é gorda. No cálculo complexo entre homens e mulheres, Milly sabe que gorda é sempre feia e que ser feia e magra deixa uma mulher radicalmente mais desejável do que gorda e qualquer outra combinação, tipo bonita charmosa, inteligente ou legal.” Confere?
Gay é filha de imigrantes e não exatamente magra (tema sobre o qual escreve em Fome – Uma Autobiografia do Meu Corpo, também publicado pela Globo Livros). Não tão bom quanto Cat Person e Outros Contos (Cia das Letras), de Kristen Roupenian, outra coletânea publicada no Brasil em 2019 que aborda o universo feminino contemporâneo, Mulheres Difíceis é uma obra interessante, mas irregular – dois ou três contos médio-fracos estão sobrando. A autora podia ter cortado uma gordurinha. Do livro.
Tags: literatura, Roxane Gay