20/08/2020, 08:33
Os haters também amam
por André Cunha
Poucas palavras têm um sentido mais pejorativo do que hater, e não é pra menos. Propagador de ódio e perpetrador de bullying, o hater infesta a internet com seus maus sentimentos, ofende, ameaça e constrange. A grande originalidade do longa-metragem polonês Rede Ódio (2020), no original Hejter – em inglês The Hater – é valer-se de um protagonista que, apesar de um legítimo representante da classe, continua sendo apenas e tão somente um ser humano.
Dirigido por Jam Komasa, o filme narra a história de Tomasz Giemza (Maciej Musiatowsy), um jovem estudante que, expulso da faculdade de direito por ter cometido plágio, consegue um emprego numa empresa de relações públicas (leia-se uma verdadeira fábrica de assassinar reputações). Lá, é recrutado para fazer parte de um time responsável por sabotar a campanha de Pawel Rudnicki, um candidato liberal a prefeitura de Varsóvia com tendências globalistas (pró-imigração, pró-movimento gay etc). No afã de lograr o insidioso objetivo, desperta, utilizando manobras que passam ao largo de qualquer compromisso ético, o ódio da ala conservadora, nacionalista e isolacionista (anti-imigração, pró-famíla etc).
Tomasz faz o que faz por uma série de motivos, mas principalmente por despeito à família Krasucki, parentes distantes que o tratam com desprezo, condescendência e esnobismo. Acrescente a isso o fato de amar em segredo a filha mais nova do casal, uma jovem envolvida com drogas e crises depressivas. O roteiro costura de forma engenhosa a trajetória pessoal e profissional do difamador, fazendo com que forças antagônicas colidam num final absolutamente chocante. Qual seja, uma cena macabra de massacre ao som de Beethoven (o filme não é indicado para menores de dezoito anos). O gran-finale foi inspirado num episódio real – em 2019 um político de perfil parecido foi esfaqueado por um extremista durante um discurso.
Por essas e outras, Rede de Ódio é um filme que perscruta o que temos de mais humano. O ardil, aqui, é fazer o espectador sentir empatia por um ser profundamente ardiloso.
Tags: cinema, Jam Komasa, Rede de ódio