09/12/2021, 14:14
E o Espírito de Natal?
– Dona
Zuleica? Quando vamos montar a árvore?
– Vamos, não, Helena… Dá um trabalhão e nem vamos passar aqui.
– Ai, credo! Ano passado já não teve nada!
– Ano passado, não recebemos ninguém. Nem você tava vindo trabalhar ainda.
– Mas os meninos contaram. Juquinha ficou tão decepcionado. Disse que Papai
Noel não trouxe o que ele pediu por causa disso.
– Juquinha!? Ele nem acredita mais em Papai Noel! E pediu um pônei!!
– Tadinho… Vai ficar traumatizado. Vocês vão gastar uma fortuna em terapia
presse menino.
– Helena! Desembucha logo. O que você está querendo?
– Montar a árvore, o presépio, enfeitar a casa, fazer biscoitos…
– E desde quando você caça serviço desse jeito, menina?
– Queria ver se o espírito do Natal ajudava. Tá tudo tão ruim, tão
esquisito.
– Aqui em casa?
– No Brasil. Essa pandemia que não acaba, fome, pobreza, desemprego… Uma
gente egoísta, que só quer saber de dinheiro… Tudo tão triste. Você viu lá o
tal do Heleno? Chamando garimpeiro para acabar de vez com os índios e a
Amazônia?
– Mas acho que para esses problemas, não basta enfeitar a casa, não.
– Não sei. Natal é tempo de caridade, de amor ao próximo. Quem sabe se o menino
Jesus lá do presépio, tão bebezinho não consegue amolecer o coração dessa
gente?
– Ô, Helena… Quem se deixa amolecer, pela fé ou não, já está amolecido, já
está ajudando como pode, já está se esforçando para mudar um pouco essa
realidade. Já os outros, nem diante da imagem dEle, na cruz, por mais que se digam
cristãos. Você vê! Botaram lá no STF o tal do terrivelmente evangélico, que,
quando era Ministro da Justiça quis calar a oposição com uma lei da ditadura,
que queria abrir os templos em plena pandemia, dizendo que os fiéis aceitariam
morrer pela igreja. Vai passar os próximos vinte e tantos anos na corte dificultando
a vida das minorias.
– Aff, dona Zuleica! Depois dessa, vou mesmo montar a árvore, nem que seja
sozinha!
– Ôxi!
– Mesmo que o espírito de Natal não possa fazer nada pelo país, pelo menos,
debaixo da árvore dá pra pôr o meu presente.