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18/06/2020, 09:44

A noite dos mortos de vergonha

por André Cunha

Gênero consagrado no exterior, filmes e séries de zumbis demoraram a emplacar no país. Com exceção de A Capital dos Mortos (2008), Mangue Negro (2010) e outros poucos exemplares, o setor audiovisual brasileiro é carente de mortos-vivos comedores de cérebros. Produzida pela Conspiração Filmes em parceria com a Netflix, a série Reality Z, inspirada na britânica Dead Set e adaptada por Cláudio Torres, veio preencher essa lacuna.

Antes não tivesse vindo. Massacrada pela crítica, Reality Z conta a história de um grupo de sobreviventes num cenário inusitado: o estúdio onde era gravado um reality-show chamado Olimpo, no qual participantes se vestiam como gregos da antiguidade clássica e interagiam com elementos da cultura helênica. Com o Rio de Janeiro tomado pelo caos, o local vira um foco de resistência contra o ataque de hordas ensandecidas de zumbis sanguinolentos e sanguinários. 

Reality-shows, caos urbano, doenças letais e contagiosas… em tempos de pandemia, a série tinha tudo pra se comunicar diretamente com milhões de confinados. Infelizmente, ao contrário dos clássicos do gênero, não há qualquer crítica social implícita. Tampouco nenhum comentário sobre a cultura brasileira (nem a grega) e nem sinal originalidade.

Os clichês estão todos lá – cenas intermináveis de perseguição, machadadas na cara, portas fechadas no último segundo e personagens, como é de praxe, tomando, uma atrás da outra, as piores decisões das suas vidas. Tanto que no final do oitavo episódio os sobreviventes têm uma ideia insólita: se trancar na sala de controle, fora do estúdio propriamente dito onde ficam os escassos mantimentos, e permitir a entrada de novos personagens. Uma vez lá dentro, os felizardos atacam os alimentos com destemida voracidade. Sim, os derradeiros alimentos de que se tem notícia. A vilã Cristina (Julia Ianina) reclama: “Esse animal tá comendo meu último chocolate!” Quem, em pleno apocalipse zumbi, abre mão do último chocolate?

 

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