24/10/2022, 06:30
“Curva do Rio” e o poder da Literatura
por Felipe Lucchesi
Colunista: Felipe Lucchesi
“A Literatura mora no poder da empatia“. Certa vez ouvi essa frase (que desconheço a autoria) e a admiração e prazer pela Literatura fizeram mais sentido para mim.
O Escritor Roosevelt Colini através do seu livro: “Curva do Rio” faz qualquer leitor ou leitora revisar sobre o impacto e importância que a Literatura tem na própria vida.
Tudo isso ocorre devido aos personagens envolventes, interessantes e tão próximos, daqueles que já são possíveis encontrar na rotina comum, de cada um que lê.
As histórias contadas por Colini quebram qualquer barreira que distancie Literatura da vida fora dela e caminham dessa maneira, a uma leitura abastecida de emoção e um rio com uma correnteza forte de sentimentos.
Entrevista com o Escritor
Roosevelt Colini
Felipe Lucchesi (Jornalista) – Como surgiu a ideia de escrever o livro: “Curva do Rio”?
Roosevelt Colini (Escritor) – O livro acabou unindo dois projetos, ou dois interesses, que eu tinha há um bom tempo: escrever um conto ou romance tomando como ponto de partida uma música que conta uma história em aberto e abordar os anos oitenta do ponto de vista de jovens que viveram essa época.
A música, cujo título precede o do livro, foi composta na década de setenta por Elomar Figueira. A letra narra a história dolorosa de um pai que é forçado a abandonar a filha. Sempre que ouvia a música, eu sentia a vontade de continuar a história dessa menina, dessa filha que vê o pai partir.
Quanto aos anos oitenta, é coisa vivida. Reuni as memórias afetivas da época e selecionei fatos políticos e culturais que mereciam o registro e testemunho.
O recorte comportamental da narradora entre os anos setenta e oitenta acontece entre jovens acadêmicos e ativistas, que ela conhece após o ingresso na universidade pública. Esse estar entre dois mundos, o da migrante no bairro operário e a acadêmica entre jovens burgueses, estará sempre presente na formação da personagem.
Felipe Lucchesi (Jornalista) – Foi realizado um “esqueleto” antes de escrever o livro ou foi descobrindo as histórias junto com os personagens?
Roosevelt Colini (Escritor) – Eu só conhecia o começo e o fim do livro. O resto tive que inventar e enfrentar. (risos)
Eu prefiro construir e descobrir a história junto com os personagens. Conforme eles se desenvolvem, é como se ganhassem o poder de criar outros personagens por conta própria. Isso torna o processo de escrita divertido, embora possa dar alguma dor de cabeça.
Por exemplo: no início eu não queria que a protagonista tivesse uma filha. No entanto, quando os outros personagens ocuparam suas marcações no palco, ficou impossível sustentar essa ideia. Daí ela dá a luz a uma nova personagem, sua filha Anita.
Felipe Lucchesi (Jornalista) – Desde o início, já era esse o título do livro?
Roosevelt Colini (Escritor) – Sim, porque o título sempre foi o ponto de partida: a história da menina e seu pai. O último capítulo, que nomeio como “fecho”, traz uma frase da música.
Felipe Lucchesi (Jornalista) – A capa do livro possui uma linguagem visual muito poética. Essa já era uma proposta sua?
Roosevelt Colini (Escritor) – Ah sim, com certeza. Os elementos do rio como fluxo de memória, de recordações, de reminiscências sentimentais e afetivas.
Felipe Lucchesi (Jornalista) – O quanto as histórias contidas no livro, fazem parte da sua própria caminhada pessoal?
Roosevelt Colini (Escritor) – Eu saí de Taguatinga para São Paulo com a mesma idade da personagem. Considerando como era Taguatinga na década de 70, foi muito semelhante ao que acontece com a personagem do livro no que diz respeito à entrada no mundo da cidade grande.
O bairro operário onde ela vem morar na cidade é exatamente aquele aonde eu cheguei.
Além disso, eu fui ativista estudantil no segundo grau e meus amigos e amigas eram apaixonados pela política, pela cultura, pelo sonho de transformar o mundo.
Felipe Lucchesi (Jornalista) – A sua maneira de escrever atinge uma potência imagética muito intensa. Já pensou dessa obra ser adaptada para outros formatos: teatro, série, por exemplo?
Roosevelt Colini (Escritor) – Para esse livro eu não imaginei isso…
Pensando bem, agora que você fez essa pergunta, me ocorre que o conflito entre a protagonista e seu marido Otávio, considerando as distâncias e diferenças entre os dois, poderia render uma peça onde esse conflito aflora de forma quase selvagem…
Felipe Lucchesi (Jornalista) – A sua admirável trajetória profissional lhe concedeu mais tranquilidade na hora de escrever ou há uma autocobrança ainda maior pelo mesmo fato?
Roosevelt Colini (Escritor) – A tranquilidade de ter uma outra carreira que garanta o sustento é muito importante. Na minha idade, é inconcebível (pelo menos para mim) partir do zero nessa carreira, que não sustenta (materialmente) quase ninguém.
Há um escritor francês, cujo nome não lembro, mas tenho certeza que é um dos grandes do Sec XIX ou XVIII, que disse mais ou menos assim: “depois de ter presenciado o perrengue como vivem meus amigos escritores, decidi escrever somente depois de ter minha própria casa e alguma reserva”. (risos)
A autocobrança vem muito mais pela idade. Eu já li muita coisa, muita coisa mesmo. Essas referências elevam muito o nível de exigência e de autocobrança. Já ficou para trás a época dos arroubos juvenis e não há desculpa para um texto ruim.
Felipe Lucchesi (Jornalista) – Você é nascido em Taguatinga (DF). A aprovação da obra pelo público dessa localidade é de alguma forma, uma validação que ganha uma importância diferente para você?
Roosevelt Colini (Escritor) – Ganha muita importância. A minha infância foi muito boa. Taguatinga era uma babel de famílias de todos os cantos do país. Essa condição de recém-chegados eliminava as diferenças e horizontalizava as relações, pelo menos para as crianças.
Foi um choque chegar em São Paulo e ouvir das crianças termos pejorativos dirigidos a outros devido a suas origens ou etnias.
Sinopse
Em um cenário novo, a menina nordestina e de baixa renda enfrentará os desafios da migração, o começo tardio na escola e sua jornada à ascensão social por meio da educação, que a levará a seguir uma carreira acadêmica. Em meio a estas transformações, a personagem crescerá, viverá amores, a liberdade sexual, as repercussões da AIDS no Brasil, a inflação galopante e a política estudantil.
Em todas as fases, porém, ela nunca esqueceu ou deixou de procurar o pai. Ele, cada vez mais perto e mais longe, ao mesmo tempo, como o vai vem das águas de um rio que, aliás, era o local onde a menina aguardava as cartas ou o retorno dele, no Sertão.
Ao longo das décadas, três gerações de brasileiras precisarão conquistar espaço em um mundo feito para oprimi-las. No entanto, a menina, que agora é uma mulher, deverá entender que as diferenças entre sua mãe e filha podem ser a chave para superar os impasses da alma.
Ficha técnica
Título: Curva do Rio
Autor: Roosevelt Colini
Editora: Labrador
ISBN/ASIN: 9786556252353
Páginas: 224
Onde comprar: Amazon
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