30/09/2021, 10:14
Desumanos
por Nena Medeiros
Criado para conter animais de rua que pudessem representar potencial risco à saúde da população, o CCZ era, há alguns anos, uma masmorra medieval. Os bichos ficavam jogados em baias sujas e frias, à espera da morte ou de uma quase milagrosa adoção. Os doentes que não fossem logo abatidos eram misturados aos outros, condenando-os todos. Cães “acusados” de comportamento agressivo ou simplesmente de raças com má fama eram eliminados à entrada, sem qualquer chance de contraditório.
Em 2019, esse inferno foi suavizado por um grupo de voluntárias que se propôs a levar cuidados, agasalho e alimentação de qualidade. Elas passeavam com os cães, retiravam os bichos doentes e feridos para tratamento e promoviam a vacinação, castração, socialização e adoção, além de interceder pelos condenados.
Infelizmente, uma troca na gestão do órgão está impedindo o Projeto Amigos da Zoonoses de atuar. As visitas aos finais de semana estão proibidas e, durante a semana, apenas uma pessoa pode entrar por poucas horas, o que dificulta os cuidados. A retirada de animais para lares temporários ou clínicas só pode ser realizada se o grupo oficializar a adoção, o que tem sido feito, apenas em casos extremos.
Como disse Bolsonaro, “nada está tão ruim que não possa piorar” e, então, lembramos que seres humanos ficaram igualmente jogados nos hospitais da Prevent Sênior, isolados de suas famílias e servindo de cobaias para tratamentos ineficazes, em apoio ao negacionismo do Planalto. Mais: como vira-latas eutanasiados por não conseguirem adotantes, pessoas amadas de alguém: pais, mães, avós, foram privados de oxigênio, sufocados ao cabo de duas semanas de internação para não darem prejuízo, conforme denúncias apresentadas à CPI: “óbito também é alta”.
No cinema, essas histórias seriam roteiro ruim, com vilões dando gargalhada a cada maldade. Na vida real, também. Com o agravante de que não há um super herói para nos devolver a esperança nessa humanidade perdida.