05/09/2019, 08:49
Ei cara!
por André Cunha
Ideias simples podem render bons filmes. É o caso de Yesterday (2019), dirigido por Danny Boyle, em cartaz nos cinemas do país. Na trama Jack Malick (Himesh Patel) é um músico fracassado que toca em bares decadentes para audiências minúsculas. Certa noite um blecaute deixa o mundo no escuro por alguns segundos e Jack sofre um acidente de trânsito. Dias depois, ao tocar a canção Yesterday para amigos, descobre, estupefato, que ninguém a conhece, embora estejam encantados com aquela pequena joia – “você compôs isso???” Jack corre para o Google, digita a palavra “Beatles” e não acha sequer uma ocorrência a respeito (o que chega mais perto são beetles, ou besouros). Eis aí a premissa do filme, resumida na frase que estampa o cartaz: “Todos esqueceram os Beatles. Exceto Jack.”
Simples, não? Quase bobo. Mas dessa premissa despretensiosa Yesterday extrai algumas reflexões interessantes sobre o valor da arte no mundo contemporâneo. Tipo: como as pessoas reagiriam ao ouvir pela primeira vez uma canção extraordinária? Saberiam reconhecer o valor imensurável de uma obra-prima? Mesmo que genial, um zé-ninguém teria espaço no competitivo cenário da música pop nos dias de hoje? Transportando para a literatura: alguma editora grande se daria ao trabalho de avaliar um manuscrito de mil páginas chamado Ulisses de um escritor desconhecido? A sorte de Jack começa a mudar quando um músico bem sucedido – Ed Sheeran, interpretando a si mesmo – vê que há algo ali diferente de tudo que já se fez antes. Sheeran dá um empurrão na carreira de Jack que, apesar de reconhecido como “o Shakespeare da música pop”, será eviscerado pela indústria do entretenimento. Ao propor que a capa do disco de estreia seja toda branca, em homenagem ao famoso disco branco, Jack tem a ideia rejeitada pelo dono da gravadora: “levando em conta aspectos de diversidade… é branco demais!” Sheeran propõe mudar o título de Hei Jude para Hei Dude – Ei Cara. Vê se pode!
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