Certas coisas nunca mudam. Pegue, por exemplo, a estrutura de certas histórias policiais: há um crime, uma fêmea fatal, um investigador durão que faz perguntas e descobre elusivos interesses financeiros e psicológicos e por fim o gran finale, o “momento Scooby Doo”, quando o vilão, enquanto revela a própria identidade, revela também as motivações que o levaram a cometer o crime, assim como as pistas que deixou pelo caminho. Em geral esse momento se dá após Fred, Velma, Daphne e Salsicha tirarem a máscara dele. É o célebre desmascaramento. Tão celebre que incorporou-se à cultura pop na forma recorrente de memes nos quais alguém é desmascarado e a legenda: a-rá! No bordão original o vilão sempre diz: “Eu teria conseguido se não fossem por aqueles garotos enxeridos e esse cachorro idiota”.

 

Trata-se de uma forma narrativa de uma ingenuidade comovente, mas se você acha que ela se restringe a programas infantis detetivescos, acha errado. É possível encontrá-la nos mais charmosos e elegantes filmes noir e nas mais badaladas séries. E, claro, na literatura.

 

O mais recente exemplar dessa malograda linhagem é Até o Fim, de Harlan Coben, publicado no Brasil pela Arqueiro. O livro vem coalhado de elogios de outros escritores. O facilmente seduzível Dan Brown, autor de O Código da Vinci, garante: “Harlan Coben é um mestre em prender a atenção do leitor e criar histórias surpreendentes. Ele vai seduzir você logo na primeira página só para chocá-lo na última.” Chocante!

 

No livro há uma crime, uma fêmea fatal, um investigador durão etc. O “momento Scooby Doo” é particularmente ridículo. Os editores garantem que o autor é hoje O Cara nesse estilo: “Vencedor de diversos prêmios, Coben é o único escritor a ter recebido a trinca de ases literatura policial americana: o Anthony, o Shamus e o Edgar Allan Poe” e “suas obras já foram traduzidas para 43 idiomas. Aclamado na França, é conhecido como o mestre das noites em claro.”

 

Pois é, hoje em dia os franceses aclamam qualquer bobagem.

 

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