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22/12/2020, 21:10

Primeiro filme realizado inteiramente em Brasília

O ano era 1959. Numa Brasília ainda tomada por obras faraônicas no coração selvagem do Planalto Central – ainda prestes a ser inaugurada -, surge, no meio do Cerrado, a lente curiosa de um jovem cineasta. Filma, incessantemente o matracar de máquinas e homens trabalhando. Seria um dos vários registros feitos da nova capital que se erguia. A diferença é que não se trata de um trabalho encomendado, como muitos outros, mas de uma empreitada pessoal do novato Gerson Tavares, que acabara de retornar da Europa, cheio de ideias na cabeça e uma câmera na mão.

“Estávamos lá, filmando e, de repente, aparece um carro trazendo o Israel Pinheiro (então presidente da Novacap) e o Juscelino”, lembraria, anos depois em entrevista, Tavares, hoje com 94 anos, referindo-se aos bastidores do curta-documentário “Brasília, Capital do Século”. “Corri, peguei no braço dele, expliquei sobre o documentário e perguntei se podia filmá-lo por três minutos. Ele disse que sim, se fosse rápido, porque o sol estava de amargar”, contaria o ex-diretor, que mora hoje em Cabo Frio (RJ).

Seria uma estreia formidável no cinema do diretor fluminense de carreira meteórica, mas sua relação com o DF só estava começando. Dali a cinco anos, ele começaria as filmagens na cidade do longa-metragem de ficção “Amor e Desamor”, que entrou para a história como o primeiro filme totalmente rodado em Brasília. “É uma história original minha, muito intimista”, recordou Gerson Tavares, no documentário “Reencontro Com o Cinema”, dirigido pelo pesquisador e professor de Cinema e Vídeo da Universidade Federal Fluminense (UFF), Rafael de Luna, idealizador e coordenador responsável pelo projeto de resgate de toda a obra do cineasta. Ousado, o projeto teria um feito singular: o pioneirismo de captar, no fragor do momento, as impressões, angústias e anseios, sentimentos de personagens vivendo num espaço vasto. Um tanto quanto vazia e intimidadora, a cidade então nascia de um projeto de nação nos seus primórdios, mas que também carregava uma forte áurea futurística, num clima quase que de ficção científica, muito impulsionado pela moderna arquitetura de Oscar Niemeyer – detalhes realçados na película, de maneira pungente, pela fotografia de Hélio Silva e música espacial de Rogério Duprat.