– Que tristeza essas enchentes…
– Muito, Helena.
– Um tio do Roberto perdeu tudo.
– Nossa! A família está bem?
– Graças a Deus!
– Menos mal. Espero que consigam voltar logo pra casa.
– Obrigada. Não é a primeira vez que a cidade lá alaga.
– Provavelmente, não será a última.
– Credo, dona Zuleica! Vira essa boca pra lá.
– Posso até virar, Helena. Mas é um fato. Com todo o descaso dos governantes frente às questões ambientais, eu não sei dizer se o mundo acaba em água ou se a água do mundo acaba.
– Para quem mora em Brasília, de um jeito ou de outro, dá para aguentar uns seis meses. Já estamos acostumados.
– Essa Helena! Consegue fazer piada até com o fim do mundo.
– Mas foi boa, não foi?
– Ótima. Fez lembrar de um filme que está dando o que falar: Não Olhe pra Cima. Já viu?
– Não. É bom?
– Consegue ser engraçado, mesmo  falando de tragédia. Mas dá um pouco de nervoso ver a representação desse momento surreal que estamos vivendo.
– É sobre a pandemia, né?
– Não. Começou a ser produzido antes, ainda em 2019. De acordo com o Di Caprio, é sobre o aquecimento global. Mas, acho que caiu como uma luva, já que mostra os cientistas alertando para um perigo real e sendo ignorados pelo governo, mais interessado em agradar os endinheirados do que proteger a população. E mostra a força das redes sociais, a divisão da opinião pública entre os que acreditam e os negacionistas…
– Não fala mais nada. Vou dar um jeito de assistir.
– Tá. Só mais uma coisa: você acredita que, mesmo com tudo desenhadinho no filme, os negacionistas tentam distorcer a história para parecer que eles é que estão com a razão e que o que os mocinhos querem provar é que as vacinas fazem mal?
– Gente louca! Esses dias uma colega da escola postou uma mensagem antivacina no grupo. Quebrou a cara. Todo mundo ali ansioso pro bozo liberar a vacinação pras crias voltarem pras aulas…
– É… Ainda bem que esse discurso não pegou aqui.
– Pegar, pegou. Mas é só o discurso mesmo. A abençoada já tomou até a terceira dose!
– Surreal!