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01/10/2020, 08:48

Tolinhos

por André Cunha

Filmes sobre adolescentes fazendo besteira não são fáceis de digerir, mas permanecem como relevantes documentos históricos sobre determinada época ou geração. Quem quiser saber um pouco mais sobre os anos 90, por exemplo, não pode deixar de assistir Kids (1994), dirigido por Larry Clarck, um drama sobre a molecada promíscua e drogada de Nova Iorque. Realista ao extremo, o longa-metragem dividiu opiniões. Por um lado, houve que o lesse como uma apologia da irresponsabilidade. Por outro, muitos o interpretaram como uma reflexão sobre os riscos do sexo sem camisinha e do abuso de substâncias entorpecentes. Nem uma coisa nem outra, Kids é uma narrativa visceral sobre aquele tema.

A confusão, típica de quem não entende patavina de arte, voltou a tona com o lançamento de Lindinhas (2020), de Maimouna Doucouré. No original em francês Mignonnes, em inglês Cuties, o vencedor do último festival de Sundance atualiza questões comportamentais do século XXI e retrata um grupo de pré-adolescentes francesas às voltas com exposição on-line, rebeldia e descoberta da sexualidade.

E dá um passo além, ao abordar o choque de culturas sem hipocrisia nem condescendência. Uma menina muçulmana descendente de senegaleses, Amy (Fathia Youssouf), sufocada pelas antiquadas tradições familiares, vê-se seduzida pelo modo de vida ocidental – e tudo o que ele tem de libertador e degradante. Incorporada a um grupo de meninas espevitadas que sonham em participar de um concurso de dança, Amy envolve-se numa teia de rivalidades interpessoais, futilidades materiais e a necessidade doentia de curtidas e likes. Numa cena chocante, prestes ter o telefone (que roubara) confiscado, ela tira uma foto da genitália para postá-la na rede. Noutra, quase mata uma rival. A despeito do mérito cinematográfico, Lindinhas recebeu uma enxurrada de críticas por supostamente explorar a sexualização precoce, com destaque para a ministra Damares Alves, escandalizada com o fato de meninas de onze anos dançarem de forma sensual. Sabe de nada, inocente.

 

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